Cuidado com o "fisgo d'um"
“Outra coisa boa de passar uns dias
no interior do Brasil são as histórias, ou melhor, os causos contados pelos
parentes mineiros. Este eu ouvi ontem e é baseado em fatos reais, de fonte
fidedígna.
João da Penha era plantador de
grandes terras lá do interior de Minas Gerais. Conhecido pelas riquezas, o
uso de roupas simples e o inseparável facão pendurado na
cintura. Homem matuto de costumes campesinos que fazia questão
absoluta, por assim dizer, de ir até o gabinete do prefeito para pagar todos os
impostos de sua gleba.
Nilton Chaves era o prefeito da tal
cidadezinha de 8 mil habitantes da região. Afamado por receber os
conterrâneos com o coração aberto e os inimigos políticos com palavras
cautelosas. Tinha grande compaixão pelos aflitos e necessitados de assistência.
Acostumado com o cotidiano da
roça, naquele dia, Sô Jão fazendeiro amanheceu com os primeiros raios de sol
para honrar o compromisso dos tributos municipais.
_ 'Dia. - cumprimentou Sô Miguel,
funcionário do financeiro.
_ Bom dia, como tem passado o Senhor,
Seu João?
_ Tô aqui pra pagar as pedência do
terreno.
_ Sim, Senhor. Sente-se que vamos
logo resolver o assunto.
Ajeitando o facão foi sentando e
ouvindo a prosa do Senhor funcionário.
_ Aqui está o valor total e o Senhor
vai ver que este ano temos um acréscimo referente à manutenção das estradas da
zona rural de nossa cidade.
João, astuto que era, olhou
atravessado e disse:
_ Mas as estradas que vão dar nas
minhas terras não viram esse tal de benefício. - respirando fundo,
completou o sertanejo:
_ Pois que o Senhor não me venha
com essa gabola, com risco d'eu tirá o fisgo d'um. - acariciando o
facão,
De veras nas estradas das redondezas
da fazenda do Sô Jão não tinham passado um tratorzinho sequer. E Seu
Miguel conhecedor do pavio curto do conterrâneo João foi tratando de ir até o
gabinete do prefeito argumentar.
_ Seu Prefeito, o João da Penha está
aqui dizendo que se cobrarem o imposto referente as estradas ele vai tirar o
"fisgo dum". Que é que eu faço?
_ Tudo bem, Miguel, manda ele vir
falar comigo que eu resolvo a peleja.
Voltando à sala, Miguel anuncia:
_ Tudo certo, Seu João, o prefeito
vai receber o Senhor agora mesmo.
Depois de um cafezinho e um dedo de
prosa saem de dentro do gabinete os dois compadres abraçados. Então o
prefeito sorrindo amarelo finaliza o argumento:
_ Miguel, anote aí na caderneta que o Senhor
João da Penha vai acertar o valor (pausa) quando e como puder.
O fechamento da história foi uma dívida
perdoada e muitos fígados preservados."
Postado por Isabela Carvalho Santos
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